Um dos desafios de
ministrar um treinamento de curta duração de gestão de projetos para um público
heterogêneo é a decisão pela abordagem, tradicional ou construtivista [1]. No caso da
abordagem tradicional os casos práticos de conexão entre a teoria e a prática poderiam
se perder e o estudante que tem algum conhecimento do tema poderia se distanciar
ou até mesmo se desinteressar. Já por outro lado, na abordagem construtivista, a exigência sobre o estudante causa estranheza por não ser, geralmente, a abordagem
comumente utilizada ao longo da vida acadêmica da maioria de nós alunos ou professores.
A questão colocada aqui é: "Seria possível fazer com
que o treinamento em gestão de projetos fosse dinâmico, assertivo e transmitisse o verdadeiro
propósito de se gerir projetos levando o foco da aprendizagem para o estudante,
ao invés de se concentrar no instrutor?"
Fiquei tentado em construir o treinamento com o
objetivo de responder positivamente à questão colocada com o forte propósito de
transmitir o que mais importava: fazer de nossas atividades e por que não de nossas vidas em projetos divertida, simples, rápida e barata.
O treinamento é voltado para profissionais
graduados de nível superior, Administradores, Supervisores, Coordenadores,
Gerentes, Superintendentes, Líderes de equipe, Diretores e profissionais
interessados em adquirir ou atualizar conhecimentos em gestão de projetos para
realização de ações estratégicas nas organizações. Tive o prazer e
a honra de ministrar este treinamento em agosto deste ano na cidade de
Uberaba para uma equipe que tinha a seguinte formação:
Figura 1 - Mapa da equipe que recebeu
o treinamento.
Tenho alguns objetivos
particulares em escrever este texto que são a ampliação do meu conhecimento,
demonstrar os aspectos gerais do método usado e de receber críticas e sugestões
diversas, sendo assim busco ser uma pessoa e um profissional melhor.
Fiz pesquisas sobre o tema e me
chamou a atenção a reportagem da Paula Adamo Idoeta da BBC Brasil [2]:
“Oito coisas que aprendi com a educação na Finlândia”.
A reportagem trouxe inspiração
para o desenvolvimento deste trabalho, tomando como base a análise de um dos
sistemas de ensino mais elogiados do mundo, o sistema de ensino da Finlândia.
Portanto a ligação entre projetos reais vivenciados por mim e o conhecimento
teórico que os alunos tem por objetivo receber, fez com que fosse possível
desenvolver a abordagem com foco na seguinte tese: Ao professor cabe mediar a
interação na sala de aula e saber quais metas têm de ser alcançadas no projeto.
O treinamento é dividido em três
etapas e composto pela apresentação de exemplos práticos, pela elaboração de
respostas à questões inusitadas e pela crítica ao óbvio, no entanto é
totalmente aderente às melhores práticas de gerenciamento de projetos
veiculadas pelo PMI (Project Management Institute).
Figura
2 – Exemplo de projeto acadêmico baseado em
projeto real
(respeitando todos os direitos de confidencialidade)
Além
disso, são realizados simulados eletrônicos onde é possível verificar a
aderência do conteúdo e o controle do aprendizado em tempo real. Assim que se
finaliza o simulado é apresentado o resultado geral para a equipe, discutidas e
esclarecidas todas as questões fazendo com que o estudante reflita sobre seu
desempenho e sobre o projeto.
Figura
3 – Exemplo do resultado do simulado eletrônico
que é verificado imediatamente após a sua conclusão.
A primeira etapa é a exploração
teórica dos processos de gerenciamento de projetos: iniciação, planejamento,
execução, monitoramento e controle e encerramento. Também se faz a integração
deste conteúdo com as dez áreas de conhecimentos de gerenciamento de projetos.
A
atuação ativa do aluno na elaboração de documentos como se todos pertencessem à
empresa hipotética formada pela turma treinada é uma forma de tornar o cenário em que o estudante está inserido o mais dinâmico possível e também crível e realístico.
Figura 4 – Exemplo de documentos
fornecidos para que o estudante possa elaborar seu projeto no treinamento. São
padrões usados em grandes empresas e que o aluno pode levar para o seu ambiente
de trabalho.
Na segunda etapa a partir da
escolha, realizada pelo instrutor, do projeto a ser desenvolvido pelos alunos se constrói as bases para o aprendizado. A escolha do projeto deve
permitir a construção de uma dinâmica conectada à terceira
etapa, que viria sucessivamente.
Ainda nesta etapa é necessário que seja construído o plano de desenvolvimento
do projeto, sendo assim se realiza a iniciação e o planejamento do projeto.
No caso da equipe de Uberaba foi
escolhido um brinquedo e toda a contextualização e interconexão entre a teoria e
a prática foi realizado com ele. Desde a elaboração de um mapa mental
utilizando o software MindMeister [3],
EAP (estrutura analítica do projeto), redação do máximo de informação sobre o
projeto: o que é o projeto, o como fazê-lo, as restrições, as premissas, entre outras informações. Fazendo com que se vislumbre o máximo possível as áreas de conhecimento antes da execução em si.
Figura 5 – Brinquedo utilizado para a
realização do projeto.
Na
terceira e última etapa se deu seguimento ao desenvolvimento do projeto e neste
ponto o instrutor entrega ao time o plano de desenvolvimento do projeto elaborado iniciado na etapa dois e completado com
informações adicionais para que eles possam executar o projeto e certamente efetuar
as iterações, registro das mudanças, compartilhamento de ideias, realização do monitoramento e controle do projeto, além disso, realizar o término do encerramento do projeto.
Figura 6 – Documentação elaborada pelo
instrutor a partir do que foi realizado na segunda etapa e completado com
informações necessárias para o desenvolvimento da terceira e última etapa.
Como o projeto é inusitado e
seguramente único, todos os requisitos e planejamentos desta etapa do treinamento
são realizados com base no objeto escolhido. No caso da equipe de UBERABA foi
feita a divisão em sub-equipes que se responsabilizaram pelo desenvolvimento de
algum item e cada sub-equipe trabalhou como um fornecedor de parte do produto à uma empresa maior denominada montadora que por sua vez deveria certificar a montagem final, testes e aprovação do
conjunto completamente montado e pesado. Deveriam ser levados em consideração requisitos
importantes de massa, custo e tempo.
A divisão dos estudantes foi feita em quatro sub-equipes:
- Cabine
- Chassi
- Caçamba anterior
- Caçamba posterior
Nesta etapa era necessário
elaborar o manual de montagem do brinquedo:
O tempo era uma restrição e cada
hora de trabalho da equipe equivalia a um mês de desenvolvimento.
A massa do brinquedo era uma
restrição para que fossem feitos os testes requeridos pela qualidade. Para que
fosse feita a dinâmica providenciei para os estudantes massinha de modelar [4],
balança e etiquetas.
Para maior aderência ao processo
foi estabelecido o custo horário da utilização da mão-de-obra, além do custo do veículo
e custo da massa que deveria ser adquirida a medida que fosse necessário. Sendo
que uma premissa da empresa era que todos os fornecedores trabalhassem para que
o veículo fosse o mais barato possível, entregue dentro do prazo e respeitando os requisitos dos testes, logo isto necessitaria de comunicação,
organização e integração.
O instrutor também faz com que o
clima, ou melhor, o ambiente de projetos e a interligação com o ambiente
empresarial aparecesse, sendo assim que faz solicitações de mudanças no escopo ou no
gerenciamento de tempos em tempos, além de pressão para obtenção de informações
para a elaboração de relatórios que deveriam ser levados à diretoria.
Figura 7 – Teste de estabilidade é
feito considerando que as rodas posteriores do carro deveriam permanecer
apoiadas ao solo após a montagem da cabine que tinha massa entre 380 e 450
gramas.
Figura 8 - Teste de estabilidade é
feito considerando que as rodas posteriores do carro deveriam permanecer
apoiadas ao solo após a montagem da cabine que tinha massa entre 380 e 450
gramas. Teste OK!
Um exemplo foi a realização do teste de retenção, sendo que foi dada uma lixa de unhas à equipe para desgastar a trava mecânica que há na parte posterior do brinquedo os requisitos do teste e o modo de fazê-lo eram:
Teste de abertura da caçamba posterior: a. Montando a caçamba anterior com a caçamba posterior b. Virando-a de "cabeça para baixo" c. Apoiando-a em uma superfície plana d. Efetua-se o teste.
# ABERTURA = O teste é feito utilizando 120 gramas de massa que quando colocada na parte inferior da caçamba posterior exerce peso para que seja aberta a caçamba sem que seja feito esforço externo adicional.
# CARGA DE RETENÇÃO = O teste é feito utilizando 80 gramas de massa que quando colocada na parte inferior da caçamba posterior exerce força e a caçamba posterior não poderia se abrir.
Vídeo 1 - Teste de retenção. Teste OK!
Figura 9 – Projeto final testado,
pesado e certificado.
Figura 10 - Projeto final testado,
pesado e certificado.
A abordagem usada neste, curto,
treinamento permitiu transmitir o principal propósito de se gerenciar projetos:
fazer atividades simples, rápidas e baratas. Acredito que aqueles que
participaram do treinamento tenham uma visão diferenciada que lhes proporciona
uma melhor administração e planejamento de ações para realização de projetos
nas suas organizações.
Acredito que a questão que motivou esta
abordagem tenha sido respondida positivamente, mesmo que possam e devam ser
feitas adaptações e melhorias que percebi ao longo do treinamento. Após o
encerramento recebi ótimas críticas e a devolutiva da equipe foi excelente para
a reflexão sobre o tema.
Foi
feito um check list de verificação de escopo do treinamento, sendo este o
resultado:
Tabela
1 – Check list de verificação do escopo do
treinamento.
Acredito
que a experiência tenha sido tão rica para a equipe quanto foi para mim.
Figura 11 – Equipe de UBERABA (MG)
Os alunos foram levados para fora
da sua zona de conforto, por terem sido levados a fazer coisas que não são aderentes
à abordagem tradicional, todavia o que demonstraram nos simulados de aderência
de conteúdo foi um resultado superior ao esperado.
"Professor, parabéns de verdade, foi muito bom esse período que esteve com a gente. Já gostava do tema, passei a gostar ainda mais. A aplicabilidade foi muito boa e os exemplos utilizados também foram ótimos."Atenciosamente,
Aluno da equipe de Uberaba (MG)